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Empatia seletiva


Compaixão, fraternidade, sensibilidade, existem vários termos para designar a capacidade humana de preocupar-se com o próximo. Preocupação fragmentada entre parâmetros físicos das necessidades básicas do homem e psicológicos do convívio social e da racionalidade do ser.
Com a multiplicidade dos meios de comunicação, criou-se uma condição aberta, que apresenta uma conectividade infinita entre pessoas no mundo inteiro. Através da mídia e das redes sociais tornou-se fácil transmitir e compartilhar quaisquer situações de prejuízo vivenciadas seja por uma única pessoa ou por uma nação inteira. Atualmente é possível saber estatísticas detalhadas sobre a fome, guerra, desastres naturais e inúmeras outras chagas da humanidade. Portanto, na teoria, ajudar o próximo, além de uma obrigação, é uma tarefa simples e cheia de possibilidades. O grande problema é que isso fica apenas no âmbito teórico.
O planeta Terra sustenta uma marca de sete bilhões de pessoas, um crescimento demográfico diretamente proporcional à desigualdade socioeconômica e à superficialização da vida. Ao mesmo tempo que a comunicação moderna escancarou as intempéries do mundo, a mesma também nos fez acostumar com essas imperfeições. Combateu-se a violência normatizando-a como atitude racional e cotidiana, apaziguou-se a pobreza como elemento natural de uma sociedade escalonada, na qual o pobre é um detalhe inevitável, e pior, sistematizou-se que a guerra, é nada mais que um confronto vital para que se mantenha a ordem. O caos gerado demonstra o lado obscuro, e infeliz, do ser humano, um yin-yang desbalanceado, na desordem entre empatia e egoísmo, o último pareceu-se, sempre, mais presente.  
Entretanto, isso não significa que o homem perdeu a sensibilidade, visto que ainda há de se lidar com a consciência individual. A demonstração de fraternidade é muitas vezes apenas uma válvula de escape do indivíduo moderno, uma forma desesperada de manter-se no padrão “bom-moço de qualidade”, por sua vez, é tida como um tributo à própria alma, um Rivotril da consciência. Destaca-se, portanto, a elevação e a taxação de cada problema, formula-se uma cartilha oculta do que merece atenção e o que é um mero acaso natural, o cidadão passa a embrandecer-se categoricamente de maneira que escolhe, talvez de forma involuntária, nichos viáveis para depositar sua gentileza, um investimento de aplicação e retorno, no qual projeta-se a compaixão para um simples conforto mental. Este que, com o tempo, aparenta necessitar gradativamente de menos aplicação e quiçá realmente a faz. Eventualmente, alguns “likes” no Facebook parecem dar conta do recado.
É, por fim, vital que a turbulência causada pela evolução intelectual do homem, não desintegre, por total, o que lhe diferencia de uma máquina. Em um mundo impregnado pelo consumismo, exigiu-se um desprendimento irreal de sua verdadeira essência, fundamentado em um sistema ilusório, que aproxima indivíduos, porém afasta interações reais de solidariedade. O fim dos tempos talvez não seja algo repentinamente catastrófico, mas um lento processo de desconstrução do que é ser, realmente, humano. 
Escrito por Leonardo Barbosa. 
“O verdadeiro contentamento vem com a empatia.” (Tim Finn)

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